O mundo Virtual Digital

O mundo Virtual Digital: algumas considerações ao debate

Dinheiro virtual, trabalho virtual, amigo virtual, livro virtual, comercio virtual, namoro virtual, crime virtual, ambiente virtual (de aprendizagem, de trabalho, de comunicação), seria possível aqui escrever várias linhas descrevendo as relações, objetos, atividades e espaços do mundo virtual digital. Todas essas virtualidades são hoje parte integrante de nossas vidas. O mundo virtual digital deve ser considerado tão real quanto o mundo tangível. O Mundo virtual está carregado de sentidos sociais. Este é então um espaço humano, de representações e simulações humanas, de natureza social. Para Levy (1996):

A palavra virtual vem do latim medieval virtualis, derivado por sua vez de virtus, força, potência. Na filosofia escolástica, é virtual o que existe em potência e não em ato. O virtual tende a atualizar-se, sem ter passado no entanto à concretização efetiva ou formal. A árvore está virtualmente presente na semente. Em termos rigorosamente filosóficos, o virtual não se opõe ao real mas ao atual: virtualidade e atualidade são apenas duas maneiras de ser diferentes. (LEVY, 1996, p. 15)

Pierre Levy (1996) em seu livro “O que é o virtual” nos mostra o significado para a palavra virtual, em seu sentido filosófico usual, principalmente antes da popularização da tecnologia informacional. Percebe-se que o virtual se trata do que pode existir potencialmente, mas que não se concretizou, ou seja, é algo possível ou em potencial. “A árvore está virtualmente presente na semente” (LEVY, 1996). Desse modo fica claro que o virtual não se opõe ao real. O virtual acaba fazendo oposição ao atual, porque o virtual carrega uma potência de ser, enquanto o atual já “é”.

O termo virtual acabou ganhando um novo sentido nos dias atuais devido principalmente a popularização da informática e das simulações computadorizadas, que quase sempre representam ou fazem analogias à sistemas e objetos do mundo físico. Hoje a palavra virtual é muito utilizada para designar ambientes e objetos de simulação em computador, embora seja muitas vezes aplicada de forma não precisa e às vezes errônea. A palavra virtual adquiriu uma idéia efetivamente ligada ao computador e a outras tecnologias digitais. Em vários dicionários on-line já é possível verificar o emprego da idéia de simulação ao seu significado.
Trataremos aqui o “virtual” enquanto simulações feitas através de tecnologia digital, ou seja, todos os objetos criados por meio de computação para proporcionar inúmeras possibilidades de realização de tarefas e interface entre o homem e as máquinas digitais. Para Castells (2008) o que existe e está em construção é na verdade uma cultura da “virtualidade real”.

[...] não há separação entre “realidade” e representação simbólica. Em todas as sociedades, a humanidade tem existido em um ambiente simbólico e atuado por meio dele. Portanto, o que é historicamente específico ao novo sistema de comunicação organizado pela integração eletrônica de todos os modos de comunicação, do tipográfico ao sensorial, não é a indução à realidade virtual, mas a construção da realidade virtual. (CASTELLS, 2008, p. 459)

Castells (2008) nos mostra que todo sistema de comunicação humano é baseado em representações simbólicas e de certa forma sendo uma virtualidade, nem por isso deixando de ser real. Castells (2008) ainda menciona que “[...] a realidade, como é vivida, sempre foi virtual porque sempre é percebida por intermédio de símbolos formadores da prática com algum sentido que escapa à sua rigorosa definição semântica”.
Desse modo, percebe-se que a realidade virtual pode ser considerada também um novo ambiente simbólico de comunicação criado a partir das novas tecnologias eletrônicas e digitais. Essa construção da realidade virtual está em curso e de forma acelerada. Dessa forma se faz necessário quebrar o paradigma da oposição que é feita entre mundo virtual e mundo real (sensível), pois o mundo virtual é uma realidade vigente há que todos nós estamos submetidos na era “pós-informacional”.
Paul Virilio em seu livro a Arte do Motor usa o termo “realidade sensível” ao invés de “mundo real” quando vai fazer distinção da realidade virtual (simulada), dessa forma não opondo virtual ao real. Seria talvez em nossa compreensão uma forma mais correta de uso do termo.
Hoje a expressão mundo real está cada vez mais presente em nosso cotidiano, principalmente quando se trata de fazer oposição a realidade virtual. No entanto é um engano considerar a virtualidade digital algo irreal. Quando nos referimos a algo fantasioso como uma história fictícia geralmente distinguimos tal objeto da realidade prática, pois aquilo não é possível de fato, devido a encontrar-se apenas no imaginário. O virtual digital não é só possibilidade, ele “é” (realidade) de fato enquanto virtual digital. Segundo Virílio (1996):

Escutemos Jaron Lanier, um dos promotores deste “abrigo” imaterial: “Na virada do século, quando a realidade virtual for amplamente difundida, ela não será considerada como um meio de apreensão da realidade física, mas antes como uma realidade suplementar. A realidade virtual nos abre um novo continente.” (VIRILIO, 1996, P. 126)

Como Lanier menciona acima, sua previsão estava certa, e de fato no presente século XXI o virtual digital já pode ser considerado uma realidade suplementar, ou melhor, uma realidade plena.
Que distinção sob o ponto de vista da realidade, poderíamos fazer entre um crime virtual digital de um crime real? Creio que nenhuma, pois ambos são crimes e estão passivos de julgamento. Roubar dinheiro em cédulas é um crime, roubar dinheiro virtual não seria um crime também? É evidente que sim! Embora países como o Brasil ainda não possuam legislação específica para tratar de crimes digitais/virtuais. Essa analogia nos mostra o caráter absolutamente real do mundo virtual digital, ou seja, ele permeia nossas vidas concretas.
Da mesma forma acontece com todas as outras relações virtuais por meio digital, como o trabalho virtual, comercio virtual, comunicação virtual e etc. São atividades que exercem as mesmas relações tanto no plano virtual quanto no material. A diferença é apenas o ambiente em que essas relações acontecem.
No Brasil um dos grandes exemplos da virtualização tem sido as eleições. Hoje o sistema eleitoral brasileiro conta com a tecnologia da informação para processamento dos votos através de urnas eletrônicas que possuem tecnologia digital, onde os eleitores votam através da simulação das cédulas de voto, num processo totalmente virtual, desde a votação, contagem de votos, até a divulgação. Esse novo sistema permitiu mais rapidez e confiabilidade no processo eleitoral.
O mundo virtual já nasce caracterizado pela representação humana e espacial. Todos os objetos virtuais digitais demandam de símbolos e signos para sua compreensão e assimilação. A forma mais prática encontrada pelo homem para construir o mundo virtual foi através da analogia com o mundo sensível. É dessa forma que hoje nos relacionamos com os ambientes informacionais através de comparações e representações.
Nossa relação com esses ambientes virtuais está cada vez mais estreita. Diferente do que muitos imaginam, ambientes virtuais digitais não estão apenas na internet ou no computador. Os Firmwares, por exemplo, são softwares que se encontram gravados diretamente em chips de memória (ROM) de um equipamento eletrônico e são responsáveis pela interface entre usuário e máquina para execução de tarefas, e não estão presentes apenas em computadores, em geral toda maquina eletrônica que possui capacidade de processamento e memória artificial digital e ainda depende de comandos ou instruções para interface possui um firmware, como celulares, impressoras, TVs, videogames, aparelhos de DVD, câmeras digitais, microondas, e etc., trocando em miúdos podemos dar como exemplo de firmware os menus virtuais de TVs e DVDs.

Em firmwares e também nos sistemas operacionais informatizados encontramos símbolos, ícones e toda uma estrutura espacial de representação simulando objetos físicos. Lixeiras, pastas, arquivos, calculadora, livros, álbuns, bloco de notas, ferramentas e etc., ícones e mais ícones representando tudo que poderia ser feito no plano físico. Esses ambientes virtuais passam a ser o lugar do trabalho, do entretenimento, da comunicação, em suma da “vida virtual”.

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