por Luís da Gama
Liso marfim,
Rubro carmim,
Para a cara pintar do estulto Creso.
Só quero, Apeles,
Lápis grosseiro,
Negro tinteiro,
Que o lorpa que retrato é muito reles.
Em roto esquife
Traço o desenho,
Com tal empenho
Que esculpo de improviso tal patife.
Ventas de mono,
Olhar sisudo,
Altivo e mudo,
Como quem de pensar perdera o sono!
Fronte quadrada,
Tendo de espeque
Um curvo beque,
Pendente da caraça mal chanfrada.
Nariz de vara,
E companhia,
Que em pleno dia
Conserva noite escura em toda cara.
Franzida a testa,
Longas beiçolas
Tem o tal bolas,
Que os lares de Minerva horrendo empesta,
Grandes orelhas
De burro velho,
E um chavelho
Sobre a colmeia de áticas abelhas.
Hirsuto o pêlo;
De porco-espinho,
Lato o focinho,
Que de vaca não é, nem de camelo.
Olhos vidrados
Entre altaneira
Negra viseira,
Que dois montes parecem recurvados.
Rubras bochechas,
Engorduradas,
E tão inchadas
Que parecem de mero amplas ventrechas!
Rotunda a pança,
Azabumbada,
Que em trovoada
Traz o gordo cetáceo — em contradança.
Pernas de croque,
Atesouradas,
E tão vergadas
Que dois arcos parecem de bodoque.
Fofo beócio,
Com ar de nico;
Grosseiro mico
Entre os sábios metido a capadócio.
Toma juízo,
Deixa a luneta,
Torto cambeta,
Que essa tosca figura causa riso.
Não sejas tolo,
Deixa o Baucher,
E Pothier,
— Tens vazia a cachola, sem miolo.
Não toma esturro,
Bruto eiviçon;
Larga o Rogran,
Que eu já vi de pensar morrer um burro.
Toma o conselho,
Que te hei dado;
Marcha, tapado,
Vai mirar essa cara num espelho.
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