Quadras ao gosto popular (10) - Fernando Pessoa


A laranja que escolheste 
Não era a melhor que havia. 
Também o amor que me deste 
Qualquer outra mo daria. 


Se o sino dobra a finados 
Há de deixar de dobrar. 
Dá-me os teus olhos fitados 
E deixa a vida matar! 


Por muito que pense e pense 
No que nunca me disseste, 
Teu silêncio não convence. 
Faltaste quando vieste. 


Tome lá, minha menina, 
O ramalhete que fiz. 
Cada flor é pequenina, 
Mas tudo junto é feliz. 


A vida é pouco aos bocados. 
O amor é vida a sonhar. 
Olho para ambos os lados 
E ninguém me vem falar. 


Dei-lhe um beijo ao pé da boca 
Por a boca se esquivar. 
A idéia talvez foi louca, 
O mal foi não acertar. 


Compras carapaus ao cento, 
Sardinhas ao quarteirão. 
Só tenho no pensamento 
Que me disseste que não. 


Duas horas te esperei. 
Duas mais te esperaria. 
Se gostas de mim não sei... 
Algum dia há de ser dia ... 


Tenho um desejo comigo 
Que me traz longe de mim. 
É saber se isto é contigo 
Quando isto não é assim. 


Leve vem a onda leve 
Que se estende a adormecer, 
Breve vem a onda breve 
Que nos ensina a esquecer. 


Quando a manhã aparece 
Dizem que nasce alegria. 
Isso era se Ela viesse. 
Até de noite era dia. 

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Poema ao acaso