Deixei de ser aquele que esperava - Fernando Pessoa


Deixei de ser aquele que esperava, 
Isto é, deixei de ser quem nunca fui... 
Entre onda e onda a onda não se cava, 
E tudo, em ser conjunto, dura e flui. 

A seta treme, pois que, na ampla aljava, 
O presente ao futuro cria e inclui. 
Se os mares erguem sua fúria brava 
É que a futura paz seu rastro obstrui. 

Tudo depende do que não existe. 
Por isso meu ser mudo se converte
Na própria semelhança, austero e triste. 

Nada me explica. Nada me pertence. 
E sobre tudo a lua alheia verte
A luz que tudo dissipa e nada vence.

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Poema ao acaso